Luiz Carlos Bresser-Pereira
Página do Facebook, 21.4.2016.
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Onde estás, Tiradentes?
Hoje é o dia de Tiradentes, e temos ainda um outro feriado, o 7 de Setembro. Os dois comemoram a mesma coisa – a independência do Brasil. Mas será o Brasil realmente uma nação independente? Formalmente, sem dúvida, mas substantivamente, apenas se duas condições fossem satisfeitas: que suas elites estivessem associadas a seu povo, quando se tratasse de competir com os demais estados-nação, e que os brasileiros soubessem qual o conflito de interesses que separa o Brasil dos países ricos ou do Norte. Estas duas condições foram razoavelmente cumpridas entre 1930 e 1990, quando o Brasil adotou uma estratégia desenvolvimentista, inicialmente sob o comando de Getúlio Vargas, realizou sua revolução industrial, e se transformou em uma sociedade moderna e democrática. Desde 1990, porém, quando fizemos a abertura comercial e financeira, nós nos rendemos ao Norte e aquelas duas condições deixaram de ser satisfeitas por nossas elites.
Ao mesmo tempo, as elites econômicas que passaram elas próprias por uma grande mudança, porque deixaram de ser elites industriais para serem elites rentistas; porque que deixaram de ser desenvolvimentistas para serem liberais; porque deixaram de pensar que o Brasil tinha um projeto nacional – a industrialização ou sofisticação produtiva – para acreditar que basta copiar o liberalismo econômico dos países ricos para o Brasil se desenvolver.
Desde 1990, portanto, as elites brasileiras perderam a ideia de nação. A eleição de Lula, em 2002, significou a ampliação das elites políticas com a chegada ao poder de trabalhadores e sindicalistas, mas esse fato novo não foi suficientemente forte para mudar o quadro. O governo, afinal, foi mais social do que desenvolvimentista, e, como já havia acontecido com o governo liberal que o antecedera, fracassou em construir um novo projeto nacional e retomar o desenvolvimento econômico.
Agora há um dado novo e trágico. As elites rentistas, que incluem a classe média tradicional, sentiram-se fortalecidas, e chegaram a uma conclusão. Para superar a semiestagnação da economia brasileira não basta mais a subordinação em relação ao Norte e a defesa de um liberalismo econômico globalizado que recusa a existência de conflito de interesses entre o Brasil e o Norte; é preciso aproveitar a crise para promover um ajuste fiscal “estrutural” que elimine os “privilégios” que um Estado “patrimonialista” garante aos pobres sob a forma de direitos sociais. Os “culpados” – que incluem também a burocracia pública – foram, portanto, encontrados. A nação – uma solidariedade básica entre as elites e o povo – confirma sua inexistência. Onde estás, Tiradentes? Onde estás, Brasil?