Luiz Carlos Bresser-Pereira
Nota no Facebook, 14.12.2016
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Dom Paulo Evaristo Arns, que hoje faleceu, foi um dos homens mais extraordinários que conheci. Durante os vinte anos da ditadura militar ele foi a personalidade pública que o regime mais temia. Não porque fizesse oposição política ao regime; ele não era político e não tomava partido nesse campo. E, sim, porque ele foi um incansável e corajoso defensor dos direitos humanos; porque ele muitas vezes enfrentou o poder dos militares.
Ele não participou da grande virada para a esquerda que a Igreja Católica da América Latina deu na reunião dos bispos latino-americanos em Medelín, no final de 1968, quando foi feita a “opção preferencial pelos pobres”. Outros grandes bispos, como os irmãos Aloísio e Ivo Lorscheider e Dom José Maria Pires, foram mais atuantes nesse momento. Mas, ocupando a diocese de São Paulo, Dom Paulo afinal tornou-se a figura maior da Igreja Católica na luta pelos direitos humanos e a democracia. Em um período em que as elites econômicas brasileiras davam pleno apoio ao regime militar, ele, rompendo com uma tradição da Igreja, não se associou a essas elites, e se transformou em uma espécie de consciência moral da sociedade brasileira.
A revolução política da Igreja Católica - tema de um ensaio que escrevi durante todo o ano 1969 e foi publicado em 1972 - terminou há muito tempo. A Igreja voltou a ser a ser uma instituição essencialmente conservadora. Mas ter contado com um bispo da grandeza de Dom Paulo Arns mostra que os grandes valores humanos que prega podem ser observados desde que haja convicção e coragem.